quinta-feira, 24 de junho de 2010


Engraçado como o mundo avança e as pessoas- aparentemente- não. Falo isso porque ando pasma com a falta de educação alheia. Há dois dias me comentaram uma saia justa diante de uma parada de ônibus lotada, em frente a um shopping. Dezenas de pessoas aguardavam a condução, no final da noite, perfiladas para organizar a entrada no ônibus e driblar o frio, quando dois marmanjos atravessam a rua correndo e, na maior cara de pau, furam a fila assim que o ônibus se aproxima, sem mais nem menos, apesar das reclamações dos que há tempos ali aguardavam.

O interlocutor me comentou ainda que os dois nem se intimidaram diante das reclamações e ostentavam um ar de superioridade, do tipo “como sou esperto” e nem tchuns para as caras de desaprovação, para os idosos e mulheres que aguardavam na fila. Causa indignação sim, mas acontece, pensei. Afinal, educação costuma ser ensinada em casa e independe de situação econômica ou classe social.

Ontem, um dia depois da conversa sobre a dupla de mal-educados, tive a infeliz ideia de dar uma passada rápida no supermercado, bem na hora do rush dos carrinhos e gôndolas. Como meus objetivos eram apenas uma garrafa de água, queijo e um quarteto de papel higiênico, peguei um carrinho pequeno, respirei fundo e segui em frente. A menos de 200 metros da largada encontrei uma amiga que não via há tempos e, apesar de estar me sentindo um trapo de cansada e sem o menor ânimo para conversar, me senti na obrigação de parar por alguns minutos.

Como meu carrinho já estava com a garrafa de água, tratei de estacioná-lo momentaneamente na entrada de um corredor, para não atrapalhar a passagem dos demais condutores, beijei minha amiga e em razão de 2 minutos, no máximo, voltei para resgatá-lo. Qual a surpresa? Alguém havia roubado o carrinho e, pasmem, deixado a garrafa no chão, exatamente onde eu havia estacionado!

Gente, não tem explicação plausível para alguém se sentir no direito de tirar as compras de outra pessoa e simplesmente afanar um carrinho de supermercado só porque, aparentemente, aquelas compras pareciam não ter dono. E se eu só tivesse ido pegar um produto na gôndola e estivesse no mesmo corredor? E se tivesse tido uma dor de barriga no meio das compras e largado o carrinho para ir ao banheiro? E se, como ocorreu, tivesse educadamente estacionado o carrinho para não atrapalhar os outros enquanto dava um abraço numa amiga e voltado rapidamente?

O supermercado estava lotado, eu estava cansada ao cubo e não tive forças para reclamar. E para quem reclamar diante de uma situação dessas? Mas, no caminho de casa fiquei pensando no que aquele roubo velado significava.

Na manhã seguinte, ao aguardar pelo elevador no prédio onde trabalho, passei por mais uma. Uma mulher simplesmente ignorou a fila do elevador e entrou assim que a porta abriu, na maior cara dura, na frente de dezenas de pessoas. Respirei fundo e não me aguentei, deixei claro que tinha uma fila atrás dela, mas não adiantou nada. Parece que algumas pessoas são blindadas e não se intimidam diante do constrangimento.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

“Outras vezes uma palavra é quanto basta”


Assisti ano passado uma reportagem especial do Edney Silvestre, na Globonews, com José Saramago. Dividida em duas partes, a reportagem mostrava muitas das faces do escritor português e um pouco de sua intimidade na casa que escolheu como bunker nas Ilhas Canárias. Diante de uma paisagem inesquecível e rodeado de livros, era lá que Saramago vivia, criava e se refugiava com sua Pilar.

Lembro que das muitas respostas surpreendentes dadas pelo escritor ao jornalista, a que mais me marcou foi a que expressava sua reação diante do anúncio do prêmio Nobel de Literatura, recebido em 1998. Na ocasião, Saramago disse não ter se importado muito com a distinção e que o universo continuaria existindo, sem nenhuma diferença, apesar disso. Humildade digna dos grandes gênios! Naquela entrevista ele falou de tudo, do governo Lula, do famoso ateísmo, da criação literária.

Confesso que admirava o escritor muito mais por suas posições e por sua oratória do que por conhecimento próprio de sua obra. Li menos de três de seus livros e não me envergonho disso. Ensaio sobre a Cegueira foi dos que mais gostei e não consegui avançar no Evangelho Segundo Jesus Cristo por conta da falta de vírgulas, que me deixava nervosa. Ano passado acompanhei toda a repercussão do lançamento de Caim e não adquiri o livro –ainda- por pouco. Também lembro da frustração por não ter conseguido assisti-lo em uma palestra recente aqui em Porto Alegre.

Acompanhava semanalmente seus pensamentos pelo blog http://caderno.josesaramago.org e ontem mesmo lembro de ter sorrido diante da genialidade de mais um comentário ali postado: “Inventámos uma espécie de pele grossa que nos defende dessa agressão da realidade, que nos levaria a assumi-la, a percebermos o que se está a passar e a fazer o que finalmente se espera de um cidadão, que é a intervenção”.

Pois bem, por essas e outras hoje senti a passagem do escritor. Fiquei triste como fico cada vez que a cultura mundial perde uma de suas estrelas. Não há mais o que falar, fica a obra, ficam as frases, os artigos, a lembrança da fala doce até para se referir a temas polêmicos e ao amor às palavras: “Outras vezes uma palavra é quanto basta” (José Saramago)

segunda-feira, 14 de junho de 2010

Felicidade em debate


Reconheço e respeito a importância dos parlamentos na história política das sociedades, mas fica muito difícil de defendê-los quando os que propõem legislações que deveriam beneficiar diretamente o cidadão acabam ganhando espaço mais pelas propostas curiosas e excêntricas que lançam do que pelo trabalho parlamentar comprometido em defesa do país.

Falo isso porque me surpreendi ao descobrir que o Senado tem se dedicado a defender a chamada PEC da Felicidade, uma Proposta de Emenda Constitucional que visa incluir as palavras “procura da felicidade” na redação atual do artigo 6º da Constituição, que enumera os direitos sociais dos brasileiros.

A intenção de alguns senadores, em apoio ao movimento + Feliz, liderado pelo publicitário Mauro Motoryn e que conta com adesão do terceiro setor e de representantes da classe artística, é pressionar o Estado para que o bem-estar seja um dever reconhecido e transformar a felicidade em um direito constitucional, ao lado da educação, da saúde, da alimentação, do trabalho, da moradia, do lazer, da segurança, da previdência social, da proteção à maternidade e à infância e da assistência aos desamparados.

Na defesa da proposta, o grupo diz que quanto maior for o esforço e o envolvimento de todos para melhorar o país, mais feliz será nossa sociedade. Ok, acredito que ninguém ousaria ir contra tal argumento, mas até que ponto uma lei será capaz de assegurar o direito de ser feliz? Até porque a mesma Constituição que nos garante os direitos sociais listados acima não tem uma sociedade nem um parlamento devidamente comprometidos em cumprir com esses preceitos.

De que adianta falarmos em defesa do direito à felicidade se a maioria da população brasileira não tem acesso à educação, a alimentação, ao trabalho? Há alguma possibilidade de garantirmos a felicidade quando falta atendimento de saúde, moradia digna, segurança, lazer e condições mínimas de manter uma vida digna?

Ao embasarem a defesa do movimento e da alteração no artigo constitucional, os defensores da medida usam como comparativo a realidade de outros países, como os EUA, Japão, Coréia do Sul e Butão, que há séculos consideram a busca da felicidade um direito, apesar de sabermos que, na prática, não são exemplares nesse sentido.

Felicidade deve, sim, ser um direito festejado e buscado incansavelmente por cada um de nós, mas ele independe até da condição humana, social, econômica de cada um de nós.

A noção coletiva de felicidade inexiste e todos sabemos que o Estado não se empenha nem se empenhará o suficiente para garantir tais condições a todos nós. Então, antes de mais nada, conquistar o direito à felicidade deve ser uma batalha particular de cada um, independente do que dizem leis, regras e governos.

Defendo com unhas e dentes o direito à felicidade e brigo por isso diariamente para beneficiar a mim e aos que amo. Mas querer cobrar do Estado tal prerrogativa, quando tantas outras ainda estão em aberto nesse país, já é querer demais, não acham?

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Inquietudes e devaneios


Hoje passei por uma situação profissional constrangedora. Fui convidada a me retirar, com mais meia dúzia de colegas, de uma reunião, sob o pretexto de que o assunto a ser tratado seria sigiloso. Detalhe: permaneceram na sala cerca de 20 pessoas. Alguma chance de manter cautela sobre algum assunto quando há mais de três pessoas envolvidas na cena? Não precisam nem pensar em me responder.

O ocorrido em si, apesar do tal constrangimento, não foi o que mais me incomodou, mas aquela sensação de não pertencer a um lugar, a um grupo, a um momento. Parei pra pensar sobre isso e me dei conta de que ando me sentindo um pouco peixe fora d’água da minha própria vida. É. Ando meio perdida, sem grandes planos ou objetivos, sem metas a serem cumpridas e sem criar falsas expectativas.

Me sinto assim em relação ao trabalho, ao momento, à vida pessoal. Parece que estou em um cruzamento e não sei qual direção tomar. Nunca aquele ditado “caso ou compro uma bicicleta” me pareceu tão adequado. Realmente não sei para qual lado correr. Sou a “mulher dúvida”, uma interrogação ambulante!

E não pensem que me sinto confortável nessa situação. Tenho queimado muitos neurônios pensando nisso. Mas, no momento, ainda não vejo claramente uma saída nem me sinto apreensiva quanto a isso. Tenho apenas a clara impressão de que preciso encerrar esse ano, como se algo me dissesse que realmente o final de 2010 será pra mim o final de um ciclo.

Talvez porque completarei 35 anos em dezembro e estarei, numa boa, mais longe dos 30 e perto dos 40. Pode parecer besteira, mas chegar aos 35 é como se fosse um ritual de passagem pra mim. Não imaginei que nessa idade eu estaria solteira, sem filhos, sem casa própria, sem ter ido a Europa e menos ainda longe da loucura de uma redação. Mas tampouco me arrependo dos caminhos que escolhi seguir até agora e de tudo o que passei e tenho vivenciado.

Fazendo um rápido balanço, não tenho do que me queixar! Não me sinto tão madura para abraçar algumas causas nem tão inexperiente a ponto de pirar diante das dúvidas. Por isso, estou apostando todas as minhas fichas no fluxo das coisas, como se diz, e deixando a vida me levar, exatamente como a música do Zeca Pagodinho, dia após dia.

Não tenho bola de cristal, não consultei as runas nem videntes, mas algo me diz que meu 2011 será um ano de transformações e que meu ritual de passagem dessa fase de inconstância será bem mais rápido do que até eu mesma imagino. Já estou aqui cruzando os dedos, faltam seis meses pela frente!