segunda-feira, 24 de maio de 2010

Divagando em Clarice


Hoje amanheci sonolenta e o dia sem sol só arrastou o problema.
Mas, hoje, também acordei com vontade de Clarice Lispector. Do humor ácido, de suas frases arrebatadoras, da inteligência aguçada e da sensibilidade exacerbada.

Muitas vezes quisera ter apenas um porcento da capacidade e da inspiração que a transformaram num eterno ícone literário. “Renda-se, como eu me rendi. Mergulhe no que você não conhece como eu mergulhei. Não se preocupe em entender, viver ultrapassa qualquer entendimento”.

Me sinto íntima dela por vezes e, ao mesmo tempo, me envergonho ao admitir que ainda me falta tanto dela para absorver. Assim como Clarice, sou um coração batendo no mundo. Alguém que escreve porque não entende e porque acredita na palavra como sua quarta dimensão.

Assim como ela, começo a escrever e não sei ao certo o que sairá de mim. Escrevo porque acho mais fácil do que simplesmente falar. Escrevo porque também “quero apossar-me do é da coisa, possuir os átomos do tempo”.
Apesar de parecer serena, também me pego constantemente inquieta. Nem sempre quero o que está feito e às vezes penso que seria mais fácil não mais ser gente, exatamente como ela pensara.

Penso e não me envergonho de, para mim mesma, parafraseá-la sem medo, de acreditar que a palavra é a nossa mais sólida forma de domínio, que anjos existem e de temer a desorientação. Por essas e outras coisas, assim como ela, enquanto em mim houver perguntas seguirei meus instintos.

Hoje, senti sua presença rapidamente ao meu lado, com os inconfundíveis olhos expressivos e a fumaça do cigarro sempre aceso. Por segundos cheguei a perceber latentes a vivacidade, a coragem e a ousadia que a marcam até hoje.

Tudo isso fez com que eu me certificasse de que vale a pena seguir divagando e correndo atrás da inspiração e que Clarice tem toda a razão quando nos incita a ver que o mais profundo pensamento da gente não passa, na verdade, de um coração pulsando. A resposta é avançar nesse sentido e passar a senti-lo vivo com muito mais frequência.

quarta-feira, 19 de maio de 2010

Viver é Construção!


Duas semanas sem postar, duas semanas de volta ao trabalho, à cidade, à rotina. Nesse período, muita coisa mudou, mas não inteiramente, não intensamente. Algumas coisas não foram feitas para ser entendidas, mas sim sentidas, vividas, manifestadas, pensadas. E assim têm sido.

Por esses dias, só uma certeza: não faço mais planos a longo prazo. Estou, na verdade, me sentindo como uma freqüentadora do AA, que vive um dia de cada vez, sem exageros. E isso já está de bom tamanho para o meu momento!

Engraçado como uma série de emoções se confundiram nessas semanas. Como uma série de imagens passou como um filme pela minha cabeça, como uma série de trilhas sonoras tem ocupado os meus ouvidos. No momento, Construção, do Chico Buarque. Aquela música que começa com o inesquecível verso “Amou daquela vez como se fosse a última...”, mais uma das obras-primas da nossa riquíssima MPB.

Não tenho ideia do rumo que minha vida vai tomar e isso é, de certa forma, inspirador e inquietante ao mesmo tempo. Incertezas na vida pessoal e no trabalho. Em outras épocas eu, a taxada de racional em excesso, estaria à beira de um ataque de nervos se sequer imaginasse passar por isso. E não é que estou aqui, vivinha da Silva, e levando tudo isso com uma certa leveza?

As rugas na testa só vão me fazer gastar mais com botox futuramente, certo? O embrulho no estômago, se evoluísse, acabaria se transformando em uma gastrite. Sem contar os novos cabelos brancos que brotariam se eu não mudasse de atitude! Por tudo isso, resolvi que o tempo da gente é realmente o agora! Sem clichês, sem rodeios, sem choro!

Sabem aquelas passagens que ficam na cabeça da gente e se perpetuam por décadas? Um almoço com uma pessoa querida, um abraço apertado da mãe da gente, uma risada fora de hora, um choro ao ouvir aquela música, a imagem de um lugar especial visitado, um beijo inesquecível? Tudo isso vale demais e faz parte da vida da gente.

Sim, são meros momentos. Passam, mas ficam registrados como tatuagem na gente. E são esses momentos que constróem o nosso repertório, que desenvolvem roteiros, que destrancam caminhos, que nos permitem viver, sem ter que necessariamente entender o que acontece em volta.

Esse é o verdadeiro mistério que fica. Viver é se permitir, é se deixar viver! Fechar os olhos e lembrar da música do Chico. Vale a pena tentar:

“Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago
Dançou e gargalhou como se ouvisse música
E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro ...”

terça-feira, 4 de maio de 2010

Da montanha russa ao mergulho


Ao final desse dia a sensação que fica é de que passei por uma montanha russa de emoções. Acordei melancólica, tive um embrulho no estômago que me impediu de almoçar e logo depois meio que estabilizei os sentimentos. Chorei um pouco no sol, li outro tanto e agora driblo a exaustão emocional traçando essas linhas.

Uma rápida volta na rua à tarde e a vontade de voltar pra casa me dominou. Trabalhei um pouco, mas permaneci com aquela sensação estranha de novo. Não quis ser simpática com ninguém, tampouco me esforçar para isso.

Fechei uma semana nesse esconderijo temporário e tenho saudade de casa, das pessoas queridas, da correria. Sei que precisava me dar esse tempo, respeitar meu ritmo interno e começar a curar a ferida longe de tudo. A acolhida não podia ter sido melhor e São Paulo é sempre um bom lugar para se ocupar a mente.

No entanto, ainda me fica aquela sensação de estar vivendo uma vida que não é mais minha. De estar protagonizando um roteiro desconhecido, de pisar em um terreno incerto, de respirar um ar que sufoca.

As vezes sinto como aquela criança que mergulha pela primeira vez, enche os pulmões de ar, fecha os olhos e quando os abre não sabe muito bem onde está. Não sabe muito bem que rosto procurar fora da piscina, a quem pedir uma toalha pra se secar.

Se eu disser que só de pensar nisso não fico com frio na barriga, vou estar mentindo. Mas, com certeza, não será a primeira nem a última vez que passarei por isso. Não lido bem com o frio na barriga, tenho enjôo, fico ansiosa, mas a vida é isso, não?

E o que seria da gente se estivéssemos sempre seguros, certos do que vai acontecer e prontos para driblar qualquer obstáculo? Se o caminho que está traçado fosse previsível, a gente não teria por que acordar de manhã com aquela sensação de que algo de muito bom está por acontecer, de que pessoas legais vão cruzar nosso caminho, de que viagens serão planejadas, de que abraços apertados serão trocados, de que muito riso e muito choro ainda virão e de que, depois de tudo isso, a gente vai olhar pra trás e conseguir dar um largo sorriso ao pensar nos dias de hoje.

E é exatamente isso que penso agora, nesse momento, pela primeira vez nesses dias doidos. Acho que respirei fundo, como naquele mergulho, e ao abrir os olhos me dei conta de que não quero mais procurar o rosto de ontem, e sim imaginar uma nova silhueta segurando a minha toalha. Tenho tanta vontade de mergulhar sim e acho que não vai demorar muito pra que eu tome coragem e pule de novo do trampolim!

domingo, 2 de maio de 2010

500 dias que virão


Domingo lindo de sol na paulicéia desvairada e, depois de dar uma volta com minha irmã pela rua decidimos almoçar tarde e ficar de papo pro ar vendo filmes, coisa que não faço há meses. Engraçado constatar que nas adversidades a gente sempre arruma tempo, coragem e se impõe diante das coisas e da vida como não costumamos fazer no dia a dia.

Pensei isso ao me dar conta que assim, do nada, decidi viajar de um dia para o outro e aqui estou, sem me preocupar com o trabalho acumulado, com os compromissos pré-agendados e com o que me espera na volta.

Pois bem, posso dizer que sobrevivi com galhardia à minha primeira comédia romântica desses novos dias. E essa façanha merece ser comemorada, pois foi feita de maneira leve, sem choro nem maus pensamentos. O titulo escolhido foi 500 Dias com Ela, que fala das coisas boas e ruins de um relacionamento que tinha tudo para dar certo, mas que acabou por decisão de uma das partes.

A perspectiva do enredo, desta vez, é masculina – o que não é muito comum nesse tipo de filme. Tom é um arquiteto frustrado, que vive de escrever cartões comemorativos e românticos e que depois de levar um fora da namorada, Summer, passa a reviver momentos dos 500 dias que passaram juntos. Nesse desenrolar, ele tenta buscar uma resposta para o que deu errado entre os dois e, a partir de suas reflexões, dribla o fracasso e o desânimo até redescobrir o gosto pelas coisas.

Pois é, como vida e arte sempre se confundem, posso dizer que, surpreendentemente, adorei o filme e decidi, ao contrário, de Tom, parar de buscar respostas. Se no momento o silêncio se impõe, talvez seja melhor assim. Reviver as coisas ainda me parece necessário, mas cada vez essa tarefa tem ocupado menos tempo do meu dia.

Aquele aperto no peito ainda está por aqui, mas não faz mais com que eu me sinta derrotada, apenas me lembra de que estou viva, de que, de repente, não vale a pena esperar por algo que talvez eu nunca venha a entender e que, afinal de contas, tudo vale e deve ter um sentido nessa vida, certo?

Por aqui, sentada num sofá que não é meu, sigo em compasso de espera, mas agora pelo que virá!

sábado, 1 de maio de 2010

Liberando arquivos da memória



Apesar de já conseguir dormir melhor, minha cabeça tem tido dificuldade para desligar de tudo o que tenho vivido. Prova disso foi o sonho que tive essa noite. Vestida de noiva, eu me via na festa do meu casamento, rodeada de gente querida, amigos, familiares, mas sem o principal: o noivo.

Na cena derradeira do sonho, minha mãe se aproximava de mim e dizia que o meu potencial noivo havia deixado um recado, avisando que estava confuso e que não se sentia apto a enfrentar a cerimônia. No entanto, outros três candidatos a noivo aguardavam em uma sala ao lado do salão da festa pela minha escolha da noite. Nossa, que pesadelo!

Acordei um pouco atordoada e, obviamente, com várias imagens e lembranças pipocando na cabeça e atrapalhando meu sono. Fiquei tentando entender como algumas pessoas conseguem se desvencilhar de suas vidas de uma hora para a outra. Como apagam, em um piscar de olhos, o que foi vivido até então e passam a adotar uma postura e um diálogo antes inimagináveis. Como descartam pessoas que antes pareciam ser uma extensão de si próprias. Enfim.

Fiquei pensando se realmente uma pessoa pode chegar a conhecer a outra de verdade, plenamente. Porque, atualmente, tenho dificuldade em obter essa resposta. Os dias estão passando, uma semana já foi, mas as perguntas ainda martelam na minha mente.
Ao mesmo tempo, travo uma verdadeira luta entre o que sinto e o que quero sentir. Um misto de saudade, de melancolia e de dúvida. Vontade de deletar parte da memória, de liberar arquivos.

Lembrei daquele filme Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças e desejei,por minutos, poder decidir o que guardar e o que jogar fora. Mas, sei que essa escolha não é minha e que, logo mais, as coisas tendem a parecer mais nítidas.

No momento, apesar de tudo, sinto saudade da vida que tinha há uma semana. E, se minha mente e meu coração ainda estão presos a essas lembranças, vou respeitar e deixar o tempo se encarregar delas. Hoje, aqui no refúgio que encontrei para por a cabeça no lugar, é hora de respirar fundo e tentar ver o mundo com outros olhos. Desejem-me sorte!