quarta-feira, 26 de outubro de 2011
Quer morar comigo?
Por IVAN MARTINS *
Talvez seja coincidência, mas parte dos meus amigos, jovens e não tão jovens, anda às voltas, neste momento, com uma velha pergunta: será hora de juntar as roupas, rachar as despesas e começar a Fase 2 da vida de casal?
Os motivos que levam ao movimento de unificação dos endereços são conhecidos. As pessoas descobrem, num dado momento, que passam mais tempos juntas do que separadas. Os pertences de cada um se movem, de uma casa para outra, em mochilas, sacolas, bolsas. É um saco. Gavetas que antes guardavam apenas cuecas ou apenas calcinhas transformam-se numa zona mista e conturbada. Objetos começam a sumir na confusão: meias, relógios, sandálias. A noite de domingo, quando tradicionalmente se faz a separação dos corpos, torna-se penosa, por motivos emocionais e práticos: quem quer fazer mala e levar tudo o que faz falta em casa? Quem quer dormir sem conchinha?
Uma alma romântica pode reclamar que estou reduzindo uma grande decisão afetiva a um punhado de questões cotidianas, mas não é isso. Eu já dou de barato que o romance existe. Só ele permite chegar ao estado de confusão de almas que antecede o morar junto. Quando ela vê na sua sala os programas de TV de que você não gosta, quando o conteúdo do nécessaire dela já se espalhou pelo seu banheiro, quando ela sabe, melhor do que você, onde a faxineira guarda a frigideira, o envolvimento está dado.
Ninguém deixa outro alguém entrar tão fundo na própria vida se não estiver apaixonado.
Pode acontecer por curtíssimo tempo, mas é raro. As pessoas só admitem na vida delas quem passa pelo controle de imigração dos sentimentos. O passaporte que vale aí é a paixão. Uma ou outra personalidade autoritária (ou carente) pode forçar a barra por algum tempo, mas a artificialidade não se sustenta. Fica na nossa vida quem a gente quer que fique. Quando não há afinidade, carinho e desejo, os sinais de desconforto são mais óbvios que uma ambulância em disparada.
Posto que as pessoas se gostem e que a vida delas já está (voluntariamente) embaralhada, começa a discussão sobre viver ou não viver junto - que está longe de ser simples. Morar com outro, não se iludam, é uma mudança radical, que exige generosidade. Quem vive junto partilha o espaço e o tempo, às vezes mais do que gostaria. Os românticos dirão: mas é bom estar junto e fazer as coisas de mãos dadas. Nem sempre, eu diria, não para todos. Há pessoas que precisam de distância mesmo daqueles que amam. E quem adora viver grudado também sente falta de silêncio e solidão. O outro frequentemente pesa, e isso pode ser destrutivo para a relação. Namorar, mesmo intensamente, ainda é conviver com o que há de melhor no parceiro, por tempo limitado.
Morar junto é abraçar o pacote inteiro, o tempo todo. Nem todo casal aguenta, nem todo mundo sabe viver assim. Unir os endereços pode significar, muitas vezes, separar as pessoas. Todo mundo conhece a história do namoro antigo que explodiu meses ou semanas depois das pessoas mudarem para o mesmo apartamento. Acontece toda hora.
Morar junto, ademais, atrapalha um lado importante da vida das pessoas, o da autonomia. No mundo ideal, depois de sair da casa dos pais todos viveriam algum tempo sozinhos. O suficiente para aprender a cuidar de si mesmos. Para lidar sem pânico com a solidão. Isso prepara para viver a dois. Quem morou sozinho sabe que é gostoso acordar numa casa vazia e perambular de cueca sem ter de falar com ninguém. Não é como despertar abraçado na pessoa que a gente ama, mas também é bom – e tem de ser aprendido.
Há muito a ser dito contra e a favor da ideia de viver com alguém, mas o essencial é simples: a gente quer e não quer esse negócio. Uma parte de nós anseia por dividir, a outra quer ser dona de tudo – do tempo, do espaço, do corpo. Às vezes, prevalece a parte que deseja liberdade, então estar com outro nos oprime. Em outros momentos, predomina o desejo de ser dois, então dividir é uma delícia. Essa dicotomia, além de onipresente, me parece universal e insolúvel. Todo mundo tem dúvidas a respeito disso. As pessoas sonham com uma paixão tão arrebatadora que dissolva todas as incertezas, mas ela não existe. Diante da possibilidade de dividir o teto com alguém, as hesitações aparecem. Sempre aparecem, por mais maravilhosa que seja a sua consorte, por mais intenso que sejam seus sentimentos.
Eu vejo dois jeitos de lidar com isso, que na vida real se misturam.
O primeiro é racional: vá devagar, avance na medida do seu conforto interior, não tenha pressa e não se deixe pressionar (inteiramente) pelo desejo do outro. Converse. Não estar pronto não significa não gostar. Não querer agora não significa não querer nunca. Não há insulto em pedir tempo. Não há ofensa em ter dúvidas. Lembre: o outro lado também hesita, embora às vezes não diga, embora talvez nem perceba.
O outro jeito é emocional. Se atire, mergulhe, beije na boca. Você nunca vai ter 100% de certeza, então corra o risco, deixe-se levar pela correnteza. A vida é uma longa experiência e viver com alguém de quem se gosta não pode ser ruim. Aprende-se um monte: conviver, brigar, transar, dividir. O melhor jeito de ser adulto é com uma mulher de quem a gente gosta. Uma das melhores maneiras de se você mesmo é estar acompanhado. Se não der certo, não era para ser. Sem drama. Ficam as lembranças, se ganha panelas.
Se você não consegue tomar coragem por nenhuma das vias, se o tempo não aclara as suas dúvidas, então talvez não seja o caso. Não é mortal. A gente namora para ter prazer e para prospectar o terreno. Se a decisão for não avançar, tudo bem. Nem todo namoro termina em chá de panela. Conheço gente que namora em casas separadas há uma década, e é feliz. A vida não tem um formato obrigatório. Descobrir o seu formato é mais importante do que ter alguém para rachar o aluguel ou ver o Fantástico no domingo.
* Ivan Martins é colunista da Revista Época e escreve todas as quartas-feiras
quinta-feira, 6 de outubro de 2011
Alimentar espírito, corpo e alma
Sempre condenei quem gasta demais com tratamentos de beleza de nomes e efeitos mirabolantes ou quem está na lista de espera para comprar a última bolsa de uma coleção top de linha ou que dedica seus finais de semana a acordar às 5 da madrugada para pegar os primeiros raios de sol durante uma corrida. Pois bem, faço publicamente o meu mea culpa e peço desculpas sem vergonha nem cerimônia.
Sim, a gente erra, a gente pré-julga, a gente tasca a primeira opinião desmedida quem vem à cabeça e nem se preocupa como bem-estar alheio. É, porque se para muitos o bem-estar está em correr 10 quilômetros, para outros pode sim estar em adquirir coisas ou em experimentar novidades.
Me dei conta disso ao descobrir como é boa a sensação de cuidar de mim, algo que só eu mesma posso fazer de maneira plena. Não que eu praticasse o autodesapego, não mesmo, mas nos últimos meses tenho tido melhores condições de me dedicar mais a mim e ao que eu realmente posso fazer para me sentir mais saudável, equilibrada, inspirada.
Não falo apenas em termos estéticos não – quesitos que também ajudam, e muito nessa busca pelo autoagrado -, mas em termos de dedicação ao que se quer no momento. Consegui colocar em frente um projeto de estudo, passei a ter mais tempo para mim e para as pessoas que me importam, venci o sedentarismo, passei a comer melhor, a dar importância à prevenção, a consumir mais cultura e menos política, a preferir o aconchego à badalação e a fazer o que de melhor podemos para nós mesmas: respeitar nossas opiniões e vontades, acima de tudo!
O resultado desse meu novo momento não poderia ser mais positivo do que tem sido. Me pego às vezes animada por estar me dedicando a uma atividade física ou acordando às 7da manhã de sábado para ir à Universidade da mesma forma com que me delicio com um filme, um vinho, um programa em família, um doce.
Como sempre ouvi falar, tem coisas na vida que não passam de questões de costume, prática, hábito e de nos deixarmos levar por aquela vozinha interna que insiste em nos dar sinais de vez em quando. E isso, sem dúvida alguma, faz toda a diferença quando o caso é alimentar nosso espírito, corpo e alma, seja gastando com tratamentos de beleza, ter o prazer de comprar aquela bolsa da coleção top ou acordando às 5 da madrugada para pegar correr diante dos primeiros raios de sol! Aproveite!
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