terça-feira, 16 de dezembro de 2008

O desasossego de Otelo


Quando adolescente, quis conhecer a obra de Shakespeare e, me lembro que, embora nunca tenha lido de fato uma obra completa do dramaturgo inglês, me senti muito atraída pela tragédia Otelo, na qual o protagonista matava a esposa, Desdêmona, por ciúmes indevido.

Pois hoje, pensando no modo de agir dos ciumentos, acabei me lembrando do pouco que li dessa obra. Pesquisando o romance no mundo encantado do Google, encontrei dois acessos que me chamaram a atenção. Um, dizia que o autor definia o ciúme como “o monstro dos olhos verdes” e dava um breve resumo do texto, lembrando que Otelo, deixa-se levar por um ciúme doentio do seu melhor amigo, Iago, com sua esposa, Desdêmona, e acaba por matar a inocente.

O outro link me fez descobrir que existe, na psiquiatria, uma patologia batizada com o nome do protagonista da obra: Síndrome de Otelo. Ela refere-se ao ciúme mórbido (ou patológico) e as emoções e comportamentos gerados a partir daí.

Não simpatizo com crises de ciúme, mas admito que sinto daqueles que amo, em uma proporção que considero salutar. Acredito que o ciúme é uma emoção extremamente comum, presente em todos nós – em graus diferentes -, mas não consigo conceber em que momento foge do normal para o patológico. E acho que os ciumentos de plantão tampouco conseguem. Isso porque, boa parte deles sequer se reconhece como ciumento em potencial.

Uma definição precisa aponta que o ciúme é um conjunto de emoções desencadeadas por sentimentos de ameaça à estabilidade ou qualidade de um relacionamento. Só por esse significado, pode-se perceber que o ciúme, por menor que seja, não pode ser uma coisa boa. Para nenhum dos envolvidos. A menos que o que seja objeto de ciúmes tenha uma baixa estima e se sinta lisonjeado e até envaidecido ao perceber que é alvo do ciúme.

Tentei vislumbrar algo de bom nesse sentimento, mas não consegui encontrar nada. O ser ciumento duvida, cria delírios, sofre com medo de perder, e, a cabo disso, acaba sofrendo com as conseqüências de suas próprias atitudes. Ou seja, acaba ameaçando a qualidade daquilo que tem, mesmo sem perceber.
Minha humilde e leiga percepção acerca do assunto me faz acreditar que o ciúme excessivo só pode ser originado pela existência de alguma insegurança pessoal, que acaba, muitas vezes, por afetar diretamente o respeito que se tem à pessoa amada. Só que, dessa forma, o ciúme dá sinais de instabilidade e idéia de posse. E isso não cheira bem. Nem na genialidade de Sheakpeare.

Dúvidas tomam conta da imaginação, fantasias são potencializadas e pode-se chegar a situações humilhantes, como mexer em bolsos e fuçar e-mails em busca de supostas provas. Isso sem falar nos que se põem a seguir os companheiros como se detetive fossem, na ânsia de comprovar o improvável, algo que sustente esse ciúme.

Nesses tempos loucos, já é tão difícil se dar uma chance, se permitir conhecer, ser feliz e ter paz. Se, apesar disso tudo, as pessoas ainda apostam no encontro, se conectam e tentam superar neuras, por que sucumbir a dúvidas e fraquezas?

Encerro com trechos de Otelo:


É o motivo... Não verterei seu sangue,
Não ferirei a sua pele branca
Mais alva do que a neve, mais macia
Que o alabastro dos túmulos...
Mas deverá morrer, para que nunca mais
Engane a mais ninguém!...


É a causa, sim, a causa, minh’alma,
Não a nomeio ante as castas estrelas:
É a causa; mas sangue não derramo
Nem mancho sua pele, alva de neve
E lisa como a glória do alabastro;
Porém tem de morrer, senão trai outros.


Hálito quente assim quase convence
A justiça a trair-se uma vez mais
Se ficar assim morta, vou matá-la,
E amá-la depois: mais uma a última,
É o doce mais fatal: agora choro,
Mas é pranto cruel, dor celestial
Que golpeia o que ama: ela desperta.

2 comentários:

Alvaro Neto disse...

O ato de se justificar pode ser tão "patológico" quanto o de se enciumar... isso se você se tomar o senso comum, ou a arrogância de quem define as patologias como um paradigma.

No meu humilde ponto de vista, tudo que existe carrega algo de ruim e de bom.

O maniqueísmo é uma das formas de escuridão do nosso espírito.

flavia:) disse...

Querida,
Ai! Acho que sou ciumenta, preciso cuidar para não ser patalógica. Uehehehe :P

Mas é fato...
"o homem vê no mundo o que traz dentro de si".

Ou seja, na minha conclusão: nenhum ciumento é santinho...
O ciumento tem medo de sofrer o que já foi capaz de fazer!
Heheh ;)
Beijo, te cuida!
Amo-te.
Veca:)